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Por dois dias o mercado financeiro no Brasil deixou de lado o Brexit e até mesmo os efeitos do terrível atentado no aeroporto de Istambul, na Turquia. O dólar derreteu e fechou nesta quarta-feira em R$ 3,23, menor valor em quase um ano. Só em junho, a moeda americana já caiu mais de 10% e nestes últimos dois dias o movimento foi bem mais intenso. O gatilho para a virada veio do discurso do novo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn. Ao fazer seus comentários sobre as previsões de inflação para este ano e para 2017, Ilan deu a dica de que vai deixar o câmbio flutuar, vai agir pouco para conter alguma alta e está contando com a queda do dólar para conseguir reduzir a inflação. Pronto. Em 24 horas o dólar encolheu e se aproxima cada vez mais dos R$ 3 – um patamar considerado muito improvável há poucos meses.
Ao perceber a consistência deste movimento mais recente, os economistas do Bradesco publicaram relatório revisando sua projeção para o valor do dólar até o final do ano. No documento enviado a clientes, os economistas lembram o curso que a moeda americana tomou desde o início do ano, quando a crise política assustava muito. Ela saiu da casa dos R$ 4 em meados de fevereiro, caiu para R$ 3,45 de média em junho e agora oscila em torno de R$ 3,30 – sem contar esta quarta-feira. Foram quatro os motivos apresentados pela análise do Bradesco, sem citar explicitamente o empurrão do presidente do BC:
“ (1) A postura mais gradualista do Federal Reserve [BC dos EUA], que acabou gerando tendência de depreciação do dólar em relação às demais moedas; (2) a recente alta de preços de commodities agrícolas, que levou a uma recuperação dos termos de troca [mais dólares advindos da exportação]; (3) os saldos comerciais robustos e a continuidade do forte ajuste externo; (4) a nova orientação de política econômica”, diz o relatório.
A variável econômica mais difícil de se prever é o dólar – e não é privilégio nosso. A moeda americana é dos Estados Unidos, responde, primordialmente ao balanço da maior economia do mundo. Como é o maior porto seguro do planeta, toda vez que acontece um chacoalhão, os investidores saem de onde há risco – mesmo que haja muita rentabilidade – e correm para ativos em dólar. Lei da oferta e de procura, quando isto acontece, a moeda encarece. Quando caminha na direção contrária, ou seja, de mais calmaria e previsibilidade, os investidores desistem de ficar com um ativo que rende tão pouco e voltam para o mundo dos emergentes e dos mais arriscados, mas com as maiores taxas de retorno disponíveis no mercado – caso do Brasil.
A complexidade em acertar a trajetória do dólar está, inclusive, em determinar o que é turbulência e o que é calmaria. O Brexit provocou uma alta da moeda nos primeiros dias depois do impacto com a escolha dos britânicos. Esta é turbulência, fácil identificar. O futuro dos juros dos EUA é decisão do Banco Central de lá (FED), não é fruto de uma crise, ao contrário. Subir a taxa é sinal de recuperação da economia americana, o que é bom para todo mundo. A mudança, neste momento, tem a ver exatamente com a relação de causa e efeito entre a crise no bloco europeu e os efeitos no crescimento das economias. Até que tudo isto fique mais claro, não é hora de mexer na taxa americana.
Mesmo com a piscada de Ilan Goldfajn, há também uma percepção crescente sobre o fortalecimento do governo de Michel Temer. Não porque ele tenha conquistado mais credibilidade política ou esteja imune à caça contra os corruptos. O que os analistas e investidores estão vendo é uma deterioração da força do PT e da presidente afastada, Dilma Rousseff. A cada evento em que vai ficando irreversível a saída dela do governo, mesmo que isto não garanta a segurança política de Temer, o mercado reduz a margem de risco dos ativos brasileiros.
Outro fator importante e com peso relevante na mudança de expectativas dos agentes de mercado está na condução das propostas e medidas apresentadas pela equipe econômica. Esta sim está blindada da crise política porque é formada totalmente por não-políticos, com perfil técnico, competência e credibilidade reconhecidas. Jogando todos estes fatores na mesma panela, sai de lá um gosto de confiança e expectativa mais positiva com o futuro. Por enquanto e, ao que tudo parece, o dólar está gostando do aroma e do gosto deste caldo e, chegar a R$ 3 pode ser só uma questão de calibragem do fogo e de quem está com a colher na mão.
Fonte: Blog de Thais Herédia para a Globo.com
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